quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Mundo Fechado

Autor: Agustina Bessa Luís
Título: Mundo Fechado
Género: Novela
Editora: Guimarães editores
2004
121 páginas





«É nas coisas banais – pensou -, nas coisas simples e sem originalidade, que reside o segredo do sentimento humano»
Agustina Bessa Luís, Mundo Fechado


Resumo: Agustina Bessa-Luís nasceu, em 1922, em Vila Meã, no concelho de Amarante e elegeu a cidade do Porto como residência mas é na cidade banhada pelo rio Mondego que escreveu Mundo Fechado, a sua primeira obra. O livro foi dactilografado por iniciativa do pai, chegando às montras e aos escaparates das livrarias em 1950, na colecção «Mensagem», dirigida por José Vitorino de Pina Martins. A escritora enviou exemplares a Aquilino Ribeiro, Ferreira de Castro, Miguel Torga e Teixeira de Pascoaes. 
O fundador da revista A Águia felicita-a com o maior entusiasmo numa carta datada de 2 de Janeiro de 1950: «Minha muito ilustre camarada! Peço-lhe [perdão] de joelhos, de não ter agradecido já a gentilíssima oferta do Mundo Fechado. […] Feriu-me sobretudo, no desenho nítido das paisagens, a figura esboçada do Personagem principal. Nisto reside o maior merecimento da obra! O ser humano, porque é vivo, é indefinido, perante as cousas mortas ou simplesmente animadas. […] Trata-se duma escritora de raça, dotada de excepcionais qualidades visionárias ou dotadas do instinto do real».
Esta novela apresenta um enredo linear e uma narrativa aparentemente simples, evocando o «peso» do tempo através da personagem central, Pedro, que tem evidentes semelhanças com o Hans Castorp de A Montanha Mágica, de Thomas Mann: «A impressão de que tudo era igual para si e seguia igual, de que entre a noite e o dia, para si, não houvera sombra nem trégua, de que vivia já infinitamente entregue ao tempo, pavoroso de tão vasto, horrível de tão sereno – isto persistia em si. “É como a certeza de ter de esperar para sempre” – pensou» (pág. 6).
No entanto, quem pensa que este mundo de Agustina se encerra neste protagonista melancólico limita a sua leitura porque toda a mundividência feminina que o rodeia dá densidade a esta personagem e profundidade às suas reflexões. Pedro saiu da capital para umas férias na terra em casa das suas tias: Rita e Maria. Este universo feminino alarga-se à Senhora Aninhas e a outras duas figuras fundamentais na construção dos afectos e identidade do protagonista: Teresa e Estrelinha. Estrelinha tinha sido um amor ingénuo da infância que agora reencontrado se distanciara profundamente do imaginário de Pedro, uma escritora não consagrada que vive sob o jugo de um irmão. Teresa, por outro lado, é viúva de um homem doente que legou essa carga genética à filha de ambos. Teresa é uma tecedeira resignada e apaziguada com esse seu destino e é precisamente este seu mundo simples de aceitação e resiliência que encantara Pedro, este mundo que lhe era inatingível e fechado. A postura de Teresa espelhava precisamente, por oposição, a incapacidade de Pedro de alcançar a felicidade das coisas banais, que é sempre onde reside o segredo do sentimento humano: «Faz medo olhar-te assim muda, cheia dessa indiferença que não sei se é a expressão do teu mundo fechado. Ah, esse mundo fechado em tua alma e nos teus olhos! Esse mundo que vocês, pobres e humildes e tristes, vocês os simples no sofrimento, os pacificamente vencidos, trazem no peito, fechado e raso e morte e ignorado para nós, os que intelectualizamos o sofrimento humano! Ah, esse mundo fechado nos teus olhos – teria eu que morrer contigo, lado a lado, para me aproximar dele, teria eu que nascer outra vez e crescer contigo, lado a lado para o conhecer». 
Nesta novela, Agustina dá corpo a esta ambivalência humana, onde se jogam oposições e dialécticas no espaço interior de um indivíduo angustiado e insatisfeito, que se afirma doente ao longo da obra, mesmo que o leitor nunca chegue a perceber verdadeiramente a razão da sua enfermidade.Mundo Fechado é um título coerente com a circularidade da escrita, do espaço e do tempo, coordenadas que se projectam em todas as obras da escritora tendo como pano de fundo esta estranha obsessão pela intangibilidade do que parece tão falaciosamente ao alcance de qualquer um neste ciclo vicioso: paradoxos da natureza humana. 
Lembremos as palavras da autora à LER em 1988: “Uma vida humana é sempre demasiado frágil e curta para fazer uma obra. O sofrimento é que traz toda essa força da vida, um desdobramento da nossa duração. É o que faz falta a muitos autores novos».


Palavras-chave: circularidade do tempo, simplicidade, Pedro, angústias e indagações interiores. 

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